quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A Última Dança Do Vereador

Cheguei no bar,ele já estava lá,sentado à mesa do canto,a telefonar,terno e gravata,todo baleado,olhar perdido e um pouco cansado.
Vereador tava preocupado,se naquele dia tinha sido de morte jurado,na Terra seria o fim do seu mandato.
Me prestou um olhar safado,tal qual estes homens brutos,sem papo,indelicados.
Convidada por alguns chegados em uma mesa do outro lado,sentei.
Em sua mesa,reparei,nada de cerveja,somente uma valisa cheia,e dois ou três telefones,entre suas mãos nervosas e disformes.
Cabelo despenteado,as pregas no rosto enrugado,tudo demonstrava seu estado.
Tomei pena do homem findado,denunciado pelo Estado,julgado e condenado,inda sonhava ser deputado.
Testa franzida,o olho molhado,desinibida fui encará-lo,sua mão era fria,o convidei pra dançar.
Deixei que o resto acontecesse,só pra ver no que ia dar,não negou o interesse,e fomos á pista do bar.
E mão na bunda era pouco,se esfregava em meu corpo feito um louco,atraiu olhares indignados de um invejoso.
Não entendiam nada os jovens e idosos que olhavam da estrada,do lado de fora do bar.
Agora sorria à toa,alegria de menino no olhar,não entendia porque interessava à mulher tão boa.
Até queria me beijar a boca,relutei,tenha calma retardado,"não sou tua patroa".
Lhe beijei enfim e não foi tão mau assim,meio seco e molhado,doce e amargo,meio sem fim.
Borrou-me o batom,pedi "Chatterton" e fui ao banheiro,vi vereador me acenar ligeiro.
Retocando o vermelho,percebi que lá no meio,entre o balcão e a pista,algo acontecia.
Saí do banheiro e minha suspeita era real,caído no chão do bar,a sangrar e sangrar,afinal.
Ainda olhou-me e sorriu,passei por seu corpo,e assim como os outros,ignorei o Edil.
Um pivete inda apareceu e lhe tirou o dinheiro,jogou a carteira por sobre o peito escondendo o buraco certeiro.
Quando saí do bar,ele ainda estava lá,caído perto da mesa do canto,terno e gravata,todo baleado.
Tinha um olhar perdido e um pouco cansado,ao lado de um copo quebrado,e um celular que gritava,com defeito.
No ar,senti no silêncio o grito de "bem feito",à força bruta e com sangue derramado,enfim terminara seu mandato.


Allan Bonfim.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Lembrei da Casa Amarela

Hoje passando por uma rua dessas com cara de antiga,com casas de estrutura tradicional,com santinho no telhado e tudo,lembrei da casa amarela,de Luana,de Mamãe.Vi o quanto que ainda tenho pra falar,pra esclarecer a quem importe,ainda o que falta por andar,por escrever.Os bairros que não visitei,os bares que não conheci.
Me lembrei da beleza nos olhos molhados de um velho dono de bar falando de seu pai,pensei no meu velho,pensei na minha vida,minhas irmãs,meus medos secretos e os explícitos.Eu vi o garoto da bicicleta que gostava de vento e rodopiava no quintal,senti na boca o gosto do suco de manga,o gosto azedo de ameixa,o cansaço depois da correria à toa.A coca naquela manhã depois da ressaca num lugar cinza ao lado de Luana,e pensei na sua morte também.
Levantei a cabeça e tomei certeza daquilo que não quero acreditar e jamais me farão mudar de idéia,do quanto mudei e talvez ainda vou mudar,dos erros que cometi e não me arrependi,afinal me trouxeram até aqui,e onde é aqui?
Hoje lembrei do Maranhão,da menina do vestido velho,dos cachorros e gatos,das árvores e das estradas,e das caras da gente que não mais vi,como estarão hoje?
Me peguei com uma certeza única e exata,sei que,ao fim do dia,terei muito mais a escrever,a amar,a fazer.E já não me surpreendo com a tristeza,me disseram que a vida é cíclica e às vezes eu concordo.Jamais terei pena,jamais poderei voar,o que não diz se eu tenho asas ou não,sou na verdade,um anjo paralítico,e pra quê ser anjo? ...sou é um pobre diabo.
Eu enxerguei os preconceitos mais sujos nas pessoas mais limpas,ah,essa gente de "cabeça aberta" tem uma cuca tão dura.E falar em vovó,sempre sentada com seu "porrete".Não julgue as pessoas,elas realmente são meras crianças inocentes,por outro lado,as "crianças inocentes" são espertas criaturas dançando e se exibindo para a impunidade de ser pequeno e pronto.Tô pensando pra onde vai a lama,essa nossa.Os nossos gritos até onde alcançam,nossas vontades não realizadas,onde vão parar?
Eu quero mais,quero fazer crônicas,quero ser crônico,mas nem tanto,a gente quer sempre resolver tudo,ser algo perto do perfeito,ser "aquela Coca-Cola toda",mas eu ficaria satisfeito em somente ser aquele simples copo d'água que lhes quebra o galho e lhes causa o melhor sentimento do mundo,matar a sede,pois,amar é com vocês.


Allan Bonfim.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Lama Nas Ruas

Deixa
desaguar tempestade
Inundar a cidade
Porque arde um sol dentro de nós
Queixas
sabes que não temos
E seremos serenos
Sentiremos prazer no tom da nossa voz
Veja
o olhar de quem ama
Não reflete um drama,não
É a expressão mais sincera,sim
Vim pra provar que o amor quando é puro
Desperta e alerta o mortal
Aí é que o bem vence o mal
Deixa a chuva cair,que o bom tempo há de vir
Quando o amor decidir mudar o visual
Trazendo a paz no sol
Que importa se o tempo lá fora vai mal
Que importa?
Se há
tanta lama nas ruas
E o céu
é deserto e sem brilho de luar
Se o clarão da luz
Do teu olhar vem me guiar
Conduz meus passos
Por onde quer que eu vá
Almir Guineto e Zeca Pagodinho.
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Hoje eu iria publicar-lhes uns versos bobos que escrevi,porém com esta calamidade que sofre a minha Cidade,decidi pela letra desta bela música que ouvi.
À população da região serrana,desejo os meus sentimentos mais puros e muita coragem,força sorte porque hão de precisar.
Allan Bonfim.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

O Poeta e O Malandro [FINAL]

Já de manhã no Green Pallace,Jânio acordou e,ao olhar o lado vazio da cama,sentiu falta da mulher que não deixava cheiro ou marca,perguntei então ao Poeta como era possível eles ficarem acordados toda a noite e o tal nem notar a moça saindo,ele sorriu e emendou que ela havia ido comprar o pão,mas logo voltara.Foi mentira,disso eu sei pois tomava um café no Bar do Braga quando um belo par de pernas e coxas,um bumbum roliço,uma equilibrada silhueta e aqueles cabelos ruivos passaram frente ao bar,em direção a um táxi que não se sabia onde ia.
Enquanto isso,o Malandro rodava pelos arredores da cidade dentro de um Ford com seu companheiro de aparte,mais malandro ainda.Durante a viagem,quase que interminável pelas ruas da cidade maravilhosa com o fim de despistar os homens sombrios,o Zé ficou sabendo de toda a história,ou pelo menos,a parte que lhe competia da história sobre Raimundo Star, (não falaram nada sobre padres,batinas ou estrangeiros) na verdade,Zé percebeu e/ou descobriu que haviam dois homens o seguindo a dois dias,estes,capangas de um grande contrabandista de bebidas que eram acionados toda vez que um fornecedor saía da linha,este seria Raimundo Star,de acordo com o Zé.
Franco e Epitáfio eram assassinos de aluguel contratados a menos de um ano pelo pessoal do tal contrabandista,faziam de tudo aqui pelo Brasil,matavam,seguiam,vigiavam e uma vez ou outra até contrabandeavam já que,naquela época,o contrabando de bebidas perdia força para o de cigarros e charutos.Sem sombra de dúvida tiveram uma infância fracassada e quiçá infeliz e viram enganadamente a "luz no fim do túnel" quando descobriram o negócio que dava dinheiro e não exigia nenhuma inteligência ou trabalho duro,apenas coragem e sangue frio.
O Malandro chegou ao apartamento às 18:37,e já era noite,e a noite era escura,e escuras eram as capas de Franco e Epitáfio que,escondidos entre os muros do prédio,se confundiam com a noite,os assassinos baratos tinham ali,o cenário perfeito para o que planejaram por toda a tarde,um assassinato,talvez se houvesse algo errado,até dois,não daria trabalho algum,colocariam no relatório e seriam devidamente,ou como se tratava de dinheiro sujo,seriam indevidamente pagos.A missão era simples,matar Star,levar sua arma,seu cordão e o dinheiro que ele havia desviado.Só tinha um problema,não sabiam eles que o homem que subia as escadas trajando um casaco,chapéu e um cordão de estrela,não era Star e sim o Malandro enganado por Star que contou a ele que jamais atirariam se pensassem que Zé fosse ele,pobre Malandro.
Pela mesma hora o Poeta descansava pelo Arpoador,ponto de encontro dos casais apaixonados na época,na verdade,procurava por Débora,e procurou por toda a cidade,mas não a encontrou,não naquele dia.
Débora esperava frente a porta do apartamento,após bater pela terceira vez já ia se virando para ir embora quando surgiu das escadas um sujeito esquisito de chapéu,casaco e um cordão de estrela com um material que imitava diamantes,era Zé.Ela lhe tirou o chapéu e deu um abraço apertado desses que recebemos de nossos amores quando ficamos muito tempo longe,o abraço durou pouco mais de 20 e poucos segundos,mas foi o bastante para que Franco e Epitáfio vissem a cena e tivessem a certeza de que aquele não era Star,pois,além de Zé não parecer em nada com Star sem o chapéu,todos sabiam que mulheres não eram bem o seu gosto,Zé adentrou o apartamento com Débora,os dois capangas permaneceram espreitando à porta.
Raimundo Star era esperto,enrolou Zé porquê sabia que,se pensassem que ele havia voltado,concerteza o seguiriam e ele avistaria os dois,dito e feito,arrancou com o carro pra Dom Pedro II,lugar onde marcou com Zé.É claro que sabia que,pelas circunstâncias,Zé jamais chegaria vivo até lá com o dinheiro,na verdade,Star já tinha marcado há dias atrás com um velho conhecido que conseguia passagens de trem,ele viajaria pra São Paulo,onde ficaria por um tempo até ser esquecido.Um táxi se aproximou e parou do outro lado da rua,piscou os faróis,Star então reparou no relógio e saiu do Ford pronto para pegar as passagens e se mandar,a porta o táxi se abriu,de dentro dele saíram duas pessoas que Star não esperava,seus olhos espantados flagraram o medo e a surpresa.
Jânio chegava em frente ao Green Pallace,desanimado,cansado e cheio de pensamentos em sua cabeça,pensava em Gabriela,pensava em seus pais,nos filhos que nunca teve,mas acredito que o que ele mais pensava era na ruiva e arrebatadora Débora Andrade.
Débora Andrade,mulher altiva e inteligente,fez tremer Raimundo quando saltou do táxi acompanhada de Zé.O bandido ficou parado observando a linda mulher e imaginando quem ela era,ficou imaginando como Zé teria escapado dos capangas.Ela fez uma festa com o pobre ladrão,disse que era da polícia,uma detetive,que o lugar estava cercado e exigiu que ele lhe entregasse a arma se não quisesse por fim levar um tiro,é claro que ele o fez.Imediatamente Débora agarrou a arma e saudou Star com toda a verdade,Zé lhe tomou o revólver e entre risos falava alto à Raimundo debochando da situação,Raimundo que tentou alguma reação,desistiu totalmente assim que viu no meio da escuridão surgir as silhuetas de mais duas pessoas,estas,Franco e Epitáfio que tinham um ar sorridente e macabro e na mão todo o dinheiro que,por Star,fora desviado.O problema estava todo resolvido,apesar de Zé não contar como Débora fez pra que os dois saíssem do apartamento com vida,os capangas tinham o dinheiro e Star,porém houve um impasse.
Franco e Epitáfio haviam sido ordenados a matar Star,recuperar o dinheiro,pegar o cordão e o revólver característico,foi aí que tudo desandou,pois o Malandro não quis entregar a arma temendo por sua vida e pela de Débora,Franco se irritou e sacou sua pistola,o Malandro jogou tudo pro alto e disparou contra Franco,Débora o agarrou e o puxou para dentro do táxi,Raimundo que era viado e não besta,correu como um louco e Epitáfio,na dúvida,disparou contra o táxi,Franco na agilidade e sede de sangue,acertou dois tiros em Star que caiu morto.
Zé gargalhava ofegante dentro do táxi,agradecendo à Débora que não sabia se lhe agradecia ou se brigava pelos tiros que ele deu,porém,aos poucos o Malandro parou de sorrir mas continuou ofegante,sua face mudou,algo em seu abdómen incomodava,ao olhar,Débora viu,era uma bala.
Franco e Epitáfio comemoravam no meio da rua,pois apesar de não terem o revólver,já tinham completado grande parte da missão,e afinal,depois poderiam pensar em recuperar,foi o que pensaram,pois logo as estridentes sirenes dos carros de polícia surpreenderam os dois que foram levados presos,souberam dias depois que a denúncia partiu das imediações da praça Dom Pedro II,por parte de um mendigo que fora procurado e pago por uma senhora ruiva horas antes do tal encontro.
Jânio já cochilava na poltrona com uma taça de vinho na mão,quando ouviu desesperadas batidas na porta de seu apartamento,imediatamente acordou por pensar se tratar de Débora,abriu a porta e tomou um susto,pois além se sua linda ruiva,se encontrava um homem ensanguentado que mais tarde percebeu ser o garçon falante do Copacabana's Bar.Débora sabia das habilidades médicas de Jânio que mesmo sem entender nada,cuidou de Zé e lhe retirou a bala e também o expulsou na tarde seguinte depois de saber toda a história.
O tempo passou,Poeta e Malandro compartilhavam a mesma poesia,a mesma malandragem,Débora Andrade,e ela definitivamente era a única coisa que eles dividiam,pois o Malandro se mudou para a Tijuca,saiu do Copacabana's Bar,o Poeta não era muito de frequentar o Clube Tropical,mas,quando se encontravam,era uma explosão nuclear,e olha que na época nem se tinha disso...o encontro que ficou marcado para sempre foi a batalha da Praça Do Xadrez,vindo da Lapa,o Malandro deu de cara com o Poeta que vinha de um festa não sei onde,os dois alterados pelo álcool embrenharam-se numa briga que parecia mais uma dança lengo-lengo,nem ao menos acertaram um soco sequer,o pessoal do Bar do Braga nem foi separar de tanto que riu,até que os dois caíram no chão e rolaram desordenados até caírem no sono (nem o Jânio,nem Zé confirmam esta história até hoje,mas eu vi),primeiro lá pras cinco acordou Zé,ajeitou o terno e foi pra casa,depois às seis e pouca,levantou Jânio que recuperou sua boina e foi tomar café no Braga.
Passaram-se 8 meses e não é que os dois se encontraram novamente,desta vez,estranhamente chegaram na mesma hora,como um encontro marcado,mas não se falaram,sentou cada um pro seu lado.Do bar eu ria junto com alguns amigos,olhavam para um lado e para o outro inquietamente,como se esperassem alguém ou algo,eis que surge um moleque,trajando sujo e com um bilhete na mão,eles,mais tarde disseram que o tal bilhete era de Débora,ficaram lá lendo e relendo o bilhetinho,pareciam meninos tristes,desolados,a mulher ruiva das belas curvas praticou a maldade de deixar dois corações apenas com um bilhete,que dizia:

"Deixo este bilhete como lembrança aos meus amores,
aos meus amigos.
Não digo que parto,nem digo que fico.
Vou sair por aí a procurar um novo lugar,
para estar e conquistar.
Vou seguir pela estrada sempre lembrando,
do vosso cuidado,do vosso carinho,
do vosso acalanto.
Termino a despedida afirmando
que lhes sigo amando,
mas já não suporto,o antes divertido,triângulo.
um tchau pro Poeta,um até ao Malandro."
Lembro que nesse dia,os dois beberam como nunca,e também conversaram como nunca,nascia uma amizade que iria perdurar por anos,é claro que depois apareceram,pro Malandro,a Rita,e pro Poeta,a Dora,mas isso é outra história,porque nada me tira da cabeça a imagem dos dois velhinhos andando pela praia sempre a procurar o belo par de pernas e coxas,o bumbum roliço e a equilibrada silhueta,seio medianos,pescoço longo,cabelos ruivos e o tais olhos castanhos que faziam qualquer um se sentir culpado por não conhecer aquela dádiva antes.
Allan Bonfim.