quinta-feira, 30 de junho de 2011

Esperança

Um dia,o Homem Do Céu ao ver a merda que tinha feito criando o homem da Terra,um ser cheio de defeitos,pensou e criou uma coisa nova e magnífica para compensar seu erro e até,sua criação anterior pelas fatalidades futuras.
Essa nova coisa sim,foi um sucesso,e totalmente eficiente em seu objetivo.Ela se arrastou entre os séculos e milênios,motivou nações inteiras,derrubou barreiras e fez cair muitos tiranos.
O nome dela é ESPERANÇA.

Foi num dia da mentira que dois jovens apaixonados,
Vestindo cauda-longa e terno,Juraram amor eterno.
Flor no cabelo e de joelhos,com a bênção do vigário
Foi um dia memorável,tudo estava lindo,
EXTRAORDINÁRIO !

Eles se esforçaram,compraram casa e carro
TV e geladeira,nova casa,uma beleza.
É numero sete da ladeira,quem sabe a ladeira?
Quem sobe a LADEIRA?

A nega preta é a lavadeira,agora pensa que é madame
Só porque comprou um novo varal de arame.
Agora quer tudo de aço prateado,
Inoxidável é a nova moda do momento,
No fundo é tudo desculpa pra não enferrujar o CASAMENTO.

A vizinha é portuguesa,o corpo uma beleza.
Seu Zé da padaria,na farmácia,O Garcia,
O olhar desvia por malandragem.
O Pereira,de voz arrastada,diz a verdade:
Portuguesa na ladeira é UNANIMIDADE.

Entendendo bem a coisa,a antes noiva e agora esposa.
Pra salvar o casamento recém-nascido,sugeriu MUDANÇA ao marido.
E lá vai o casal se mudando de pirraça.
A portuguesa,irritada:
Vão morar perto da PRAÇA !

Descem ladeira,TV e geladeira,e quase sem freio,
A carreta engata a primeira.
A casa de lá tem mais espaço,mais ar livre.
"E mais coisa pra limpar,Deus me livre"
A casa dali,tem visão pro chafariz.
"E passarinho na janela,o lugar q'eu sempre QUIS"

Decisão tomada,lugar novo pra morar,
Com cozinha encolhida e sala alongada.
Área,quarto,banheiro e amarelo na fachada,
Sem portuguesa gostosa ou lavadeira pra INCOMODAR.

Agora é cuidar do trabalho e dos filhos que vão ter,
Pois tempo é o que não lhes falta,nem TV ou geladeira.
Dinheiro,batalhando juntos,vão fazer.
Superaram a ladeira,só lhes falta a vida INTEIRA.

Allan Bonfim.

terça-feira, 14 de junho de 2011

À Nêga

Quando passo em frente ao teu portão,indo pra algum lugar,nêga.
Eu lembro daquele tempo que não é muito distante,mas já é tanto ausente que dá saudade.Lembro da gente sambando e deixando a gente do bar admirada e sorridente,aplaudindo,pensando que sabíamos dançar,besteira né,nêga? ...a gente só sentia a música e "balançava o esqueleto" e era tão fácil e bonito que parecia uma escola de dança em praça aberta.
Nêga,hoje à noite no meio da aula,eu olhei pela janela e quis ver você,sabe? ...lá fora,me chamando,me tocando o telefone pra fugir,pra escapar contigo pra esses lugares distantes que só você conhece.Eu sinto falta de você,e só você me dizendo pra parar de tomar as coisas do mundo como algo pessoal e hostil,me dizendo pra parar de fumar,dançando e sorrindo pra mim.
Sim,porque agora q'eu não te vejo mais,continuo levando tudo como pessoal e hostil,e se alguém sugere q'eu pare de fumar,eu penso na maioria das vezes:"vá tomar no cu,fumar é bom pra caramba,não pro pulmão,mas pro momento".E também porque,nêga,um monte de gente sorri pra mim,mas ninguém dança igual à você,alguém nem chega perto.

Caramba,eu tô com uma saudade IMENSA guardada no bolso esquerdo daquela minha jaqueta jeans de cheiro horrível,nêga,eu tô "trash" sem tú.Eu sei que "isso tudo é muito louco,e a viagem é perigosa",mas eu apronto a minha mala,ponho o pé na estrada e só paro no hospício se for com você.
Ah,minha nêga,tú não sabe,mas nuns dias atrás me bateu uma gripe bem forte,dessas que tiram o sono e todas as vontades,inclusive a vontade de sorrir,eu pensei que ia morrer no sofá,aí me tranquei no quarto e pensei num monte de coisa e em você,pensei em deixar uma carta.Peguei papel e caneta,sempre "à caneta",e tentei começar alguma coisa,uma despedida,qualquer coisa,mas acredita que não saía nada?! ...sacanagem,eu pensei.Uma pessoa que gosta de escrever sempre espera que,pelo menos num momento tão mórbido,possa sair algo poético,ao menos lindo,ilustre,mas nada me saiu,ficou tudo preso por causa daquela gripe.
Os pulmões estavam entupidos,e as emoções mais ainda,me faltou o ar,respirar,inspirar,inspiração,sabe? ...mas a gripe passou,eu melhorei,ficou tudo como "mais um drama exagerado",aí hoje decidi escrever sobre você,e sobre o que eu sinto por você,essa coisa linda q'eu não sei o nome,que não é amor,nem paixão,porque não foi acelerado e nem tão lento,não ardeu e nem doeu,não me fez chorar e nem rir,foi algo alegre e talvez até tão corriqueiro quanto dar comida aos pombos na praça.
O que eu sei é que sinto falta e saudade disto,de você e das suas falas,suas piadas,críticas e seu blábláblá diferente de tudo que escuto o dia inteiro.Na verdade acho que o objetivo disto é só te informar que "foi bom pra mim",mas isso cê já sabe,eu já disse,então vê se aparece.



É sempre quando passo em frente ao teu portão,
Voltando de algum lugar,nêga.
Aí então,olho pela janela e vejo tua silhueta,
Mas você,que tá sempre vendo TV,ou falando ao celular,
Nem me vê passar,nem me vê olhando pra janela,chamando teu olhar.
E quem olha pra lá,apenas vai notar seu cacheado dourado,loiro e lindo.
Que não me deixa mentir,nem ocultar.
Nêga,é só meu jeito carinhoso de te chamar.


Allan Bonfim.

terça-feira, 7 de junho de 2011

O Terceiro Quarto

Tinham uma casa linda,cheia de resquícios da estrutura colonial.
Tinham também um bonito sedan,carro de gente casada,pra caber as malas e,mais pra frente,as criancinhas bonitas,saudáveis e normais que pretendiam ter.Tinham até um quadro do Ubirajara na parede da ante-sala,que retratava uma paisagem muito linda e um lugar que não se vê mais.Era um campinho que no centro tinha um lago,cheio de patos n'água e pássaros voando pelo céu,totalmente abstrato no mundo moderno,sabe?
Na cozinha,todo o jogo de panelas e a louça que ganharam de presente no casamento.O banheiro tinha azulejos preto-metálicos,uma coisa brilhante,linda de se ver e muito difícil de limpar.
Na sala enorme,três sofás,uma cortina importada de tafetá,mesa de centro,de canto,de cartas,era muita mesa e a grande TV de plasma que,encerrava junto com a estante de madeira maciça a arrumação do lugar,tudo com a assinatura da mulher.Ele só cuidava do cachorro e do jardim.
A casa tinha no seu total,3 quartos.O primeiro quarto,em relação ao tamanho,ficava lá em cima,era o quarto do casal e ficava na segunda porta à direita depois da escadaria,tinha até banheiro dentro,já o segundo,ficava ao lado oposto deste e,como ainda não tinham as crianças bonitas,saudáveis e normais,este servia então como o quarto de hóspedes,o que não lhe tirava a beleza e o cuidado.Ela mandou pintar uma das paredes com tinta grená,as outras fez questão de deixar brancas para assim absorverem um pouco da cor mas não perderem a luminosidade do dia,o resultado foi bem legal.
Descendo a escadaria,linda escadaria com corrimão desenhado em madeira e com forma do couro de uma jibóia,via-se o terceiro quarto.Era um pouco escondido,abafado pela escadaria,sua porta nem se fazia notar por quem não fosse observador.A porta vivia sempre trancada,o lugar também não era atraente,foi deixado então pra guardar velharias e as coisas que não tinham sido ainda desempacotadas desde a mudança,era lá que estava também entre algumas caixas,um aspirador e um rádio velho,o filho retardado que nunca ousaram contar ou mostrar à ninguém.


Allan Bonfim.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Minha Senhora

Ela tem um cabelo enrolado que às vezes é liso e que já foi pixaim e também encaracolado,é também bastante longo mas às vezes tá curto,no rosto um ar de sorriso,mas ás vezes está emburrado.Ela é magra,mas já foi gorda,ou vice-versa.Começou hoje a primeira dieta de número 44.Tem calça jeans que não dá e blusa que guarda,já foi chamada de magrela na escola,já foi desejada e bonita,e ainda é.Ela descobriu sozinha o primeiro amor,o primeiro canalha,o primeiro emprego,ela ainda trabalha.Ela gosta de rock,gosta de samba,gosta de filme e é viciada em xarope,gosta de ler livros e ela já viajou de madrugada pra trabalhar.Ela não curte expressar sentimentos e tal,mesmo depois do "eu amo você".Ela é super-carinhosa e cuida de sua família.Ela tem também uma queda por álcool e já foi carregada bêbada as três da manhã.Ela já cheirou,fumou e se foi,ela não bebe mais,ela já gostou de meninas,ela agora só usa vestidos,ela guarda bem os seus segredos,e às vezes,ela me conta todos eles a troco de nada.
Ela cuidou bem dos seus filhos,ela cuidará bem dos filhos que estão por vir,e ela me dá conselhos e me diz que tô errado,ela sempre diz que estou errado e grita.Ela chora e é escondido pra eu não ver,ela chora no meu ombro e ao telefone,ela fala sozinha e gosta de animais,ela não gosta de cachorros e queria ir ao cemitério,às vezes me dá medo,ela nunca me dá medo.Já faz algum tempo que ela foi embora,já faz algumas horas que há vi pela última vez mas o que não esqueço é de como é boa a sensação de deitar a cabeça sobre o seu colo,como é bom o seu colo.Ela tem a pele clara,já foi chamada de palmito,ela é morena,e é negra,é um bombom,ela parece amarela.Ela acabou de me ligar,ela nunca me liga mas sei que,se de repente,eu sumir,ela vai ficar preocupada.
Ela é minha tia,ela é minha mãe,é minha irmã,minha amiga,minha amante,é meu amor,ela não pode ser definida porque ela é todas elas que passaram por toda a minha vida,até aqui...até aqui.

Allan Bonfim.